A frente ampla chama-se Lula


"A aliança comandada pelo petista deve compor palanques nos estados, com dois aliados estratégicos: PSB na centro-esquerda e PSD na centro-direita", diz o jornalista Rodrigo Vianna.

Desde meados do ano passado, começaram a circular análises sobre a necessidade de uma “Frente Ampla” para conter Bolsonaro. Naquele período, o presidente iniciava os ataques abertos ao STF e ao Congresso, reforçados agora em 2021 com a tentativa de cooptar policiais e militares para instalar uma ditadura.

Os defensores da “Frente Ampla” costumavam apontar o PT como um entrave para essa articulação: o partido teria dificuldades em ceder, com uma tendência para certo “hegemonismo”. A proposta de “Frente Ampla” embutia a ideia de superar o PT como principal força de esquerda, dissolvendo o partido, sua simbologia e sua história numa aliança democrática mais ampla. Um erro crasso.

A liderança da Frente Ampla para derrotar Bolsonaro ficaria com os liberais moderados e com um ou outro personagem avulso da centro-esquerda.

Mas faltava combinar com a realidade...

A vitória de Lula no STF, precedida de resistência histórica da militância nas ruas e nas redes, cancelou as condenações injustas, mudando completamente o jogo. E, então, bingo! Percebe-se agora que Lula e o PT são o verdadeiro motor da frente contra Bolsonaro. Não há outro caminho.

A movimentação de Lula, primeiro em Brasília, e esta semana também no Rio, indica o roteiro. A tal frente ampla terá o PT com Lula no comando do leme, articulando palanques nos estados com dois aliados principais: o PSB (turbinado por novas filiações) na centro-esquerda e o PSD na centro-direita.

No Rio, Marcelo Freixo no PSB será candidato a governador da Democracia contra a barbárie miliciana. Lula tenta levar o PSD (agora sob comando de Eduardo Paes) para a aliança. Felipe Santa Cruz (presidente da OAB, aliado de Paes) poderia compor a chapa com Freixo.

Em Minas, a frente deve ser liderada pelo atual prefeito de BH, Alexandre Kalil (PSD). Aqui, a esquerda entraria como aliada – sem comando da chapa.

Em São Paulo, o quadro é mais complexo. O PT paulista insiste em ter Haddad candidato a governador (nos bastidores, diz-se que Haddad não quer, prefere estar na campanha nacional); o PSOL já colocou Boulos em campo; e o PSB deve ter o quase tucano Márcio França de novo como alternativa.

Boulos seria o candidato com mais “apetite” nesse momento, e já começou a percorrer o Estado. Mas conversei com um nome próximo a ele esta semana, que confirmou: Lula é quem vai decidir, e não está descartada nem uma aliança com o PSB; nesse caso, o PT indicaria o vice de França ou ficaria com a vaga de senador, e Boulos se deslocaria para uma super candidatura a deputado federal.

Percebe-se que no triângulo das bermudas do Sudeste (Rio, Minas e São Paulo), a história do PT hegemonista não cola mais.

O partido de Lula teria candidatos próprios, sim, em três estados do Nordeste que já governa (Bahia, Rio Grande do Norte e Piauí), além do Espírito Santo (com o nome do recém filiado Fabiano Contarato). No Ceará, o governador petista Camilo Santana pode lançar um nome do PT, se a conversa com Ciro desandar mesmo de vez. No Maranhão, quem comanda o jogo é Flávio Dino - que estaria de mudança do PCdoB para o PSB. E Em Pernambuco, o PT deve se aliar ao PSB.

No Centro-Oeste, a centro-esquerda seguirá a ter imensas dificuldades diante da hegemonia da direita e do agronegócio, e talvez tenha que lançar candidaturas para marcar posição. Na região Norte, a frente de Lula precisará ser ainda mais ampla para conter o bolsonarismo – incorporando personagens como Elder Barbalho (MDB-PA) e Omar Aziz (PSD-AM), e contando com a força de lideranças progressistas como Randolfe (Rede-AP) e Edmilson Rodrigues (PSOL-PA, que é prefeito de Belém – com uma frente democrática).

A regra, em geral, é ceder espaço aos aliados nos Estados, e construir alianças ao centro – com o MDB de Renan (AL) e Requião (PR), mas principalmente com o PSD.

O partido de Kassab terá papel decisivo nessa articulação, que seria melhor chamar de Frente Democrática: uma aliança política comandada por Lula, e que parte da base de centro esquerda, mas com caráter mais amplo diante da necessidade de conter as ameaças autoritárias cada vez mais evidentes de Bolsonaro.


Jornalista desde 1990. Passou por Folha, TV Cultura, Globo e Record; e hoje apresenta o "Boa Noite 247". Vencedor dos Prêmios Vladimir Herzog e Embratel de Jornalismo, é também Mestre em História Social pela USP. Blogueiro, integra a direção do Centro de Estudos Barão de Itararé.