O julgamento de Jesus, um exemplo moderno

 


A narrativa bíblica da prisão, julgamento e condenação de Jesus, é intensa e cheia de elementos dramáticos que podem muito bem nos fazer refletir que aqui ou acolá injustiças acontecem às pessoas boas. Não me deterei na defesa teológica de que o fato ocorrido foi plano de Deus, nem advogarei que Jesus foi um preso político como muitos dizem, mas no próprio texto que deveria ser analisado pelos cristãos de hoje principalmente do Brasil.

Em primeiro lugar, Jesus o judeu, só foi identificado dentre alguns judeus à noite por causa do beijo indicativo de um amigo seu: o Judas de Queriote. O Iscariotes como conhecemos nos relatos ( não me deterei na problematização histórica acerca do personagem) fazia parte do círculo de discípulos de Jesus e vira seus milagres, ouvira seus maravilhosos sermões, acredita-se que ele mesmo tenha realizado alguns milagres com a autorização de Jesus. Judas tinha um cargo de extrema confiança era o tesoureiro do grupo ( outro problema: por que não Mateus?) e por conta dessa função desviava recursos do ministério de jesus. Com certeza Judas Iscariotes ganhou muito mais dinheiro usurpando a bolsa do que as trinta moedas pagas pelas autoridades religiosas.

Toda história tem o seu Judas Iscariotes, Joaquim José da Silva Xavier teve o seu, os índios que habitavam a América do Norte tiveram os seus. Todo revolucionário tem algum traidor entre seu grupo de amigos, muitos traídores estão dispostos a venderem sua amizade, seus ideais, a troco de ninharia. São esses Judas que estigmatizam um povo, um grupo, pessoas. Basta ver que hoje em dia poucas pessoas em nossa sociedade estão dispostas a colocarem o nome de seus filhos de Judas, mas se esquecem que havia um outro discípulo de nome Judas e que Jesus tinha um irmão ( esqueçamos as controvérsias teológicas com os católicos por favor) de nome Judas, e uma epístola do mesmo nome. A propósito, Judas é variação grega de Judá, que significa Louvor e que era o nome de um dos filhos de Jacó.

Nos getsemanes da vida é que as relações se estreitam, as amizades se firmam ou se esvaem. O que resta aos traidores é a consciência pesada de apoiarem o golpe, a traição, o que resta a eles é a corda enrolada ao pescoço e a perda de direitos conquistados.

Em segundo lugar, a peça acusatória era falsa. Que justificativas eles tinham para prender Jesus? O que se tinha como prova? A justificativa apresentada era religiosa. Ele falou contra a lei de Moisés, disse que destruiria o templo. Soa-lhe familiar? Deixa eu ajudar: “ se votarmos no PT ele irá fechar as igrejas”, “ Haddad é o anticristo, portanto o inimigo do povo de Deus”, “o PT vai perseguir os cristãos”, blá, blá, blá. Palavras são tiradas do contexto e torcidas a bel prazer dos difamadores, daí até uma pessoa boa como Jesus passa por malfeitora. As testemunhas falsas sabiam que estavam mentindo, elas receberam por isso. Foram elas que colaboraram para a aplicação do Lawfere contra Jesus, foram elas as divulgadoras de faknewes daquela época. O diferente assusta e para os vis sem argumento o que resta é a campanha difamatória, e assim Jesus foi levado à Pilatos.

Ao ser apresentado a Pilatos os religiosos da época não poderiam se apresentar com o argumento religioso, pois Pilatos não se metia em questões desse tipo ( quem dera nosso estado fosse laico!). Como raposas velhas que eram inventaram outra: “Ele se faz rei e só temos César como nosso rei”. A pseudo sinceridade não convenceu Pilatos, mas fazer o quê? Diante dele ( Pilatos ) estava um inocente disso ele tinha certeza. Cadê o advogado desse homem? Não tem, ele não tem direito a um advogado nem a um Habeas Corpus, só o de ficar calado e isso ele ficou. O que movia aqueles homens não era a convicção firme da fé judaica, nem a simpatia política por Roma, nem a preocupação com o povo. O que movia-lhes era a inveja, o ódio à simplicidade e a grandiosidade de Jesus de Nazaré.

O crime de Jesus foi dar vista aos cegos, fazer paralíticos andar, curar toda sorte de moléstias, multiplicar o pão a um povo que não precisa só ouvir um discurso bonito, mas de soluções concretas para as suas existências.

Por último, não podemos deixar de mencionar a omissão de Pilatos, que mesmo constatando a inocência de Jesus, lavou as mãos diante de uma turba ensandecida.Não há água que limpe as mãos sujas de sangue derramado pela omissão.


Márcio Roberto de Carvalho é ativista negro filiado ao PSOL e historiador pela UFPB