Bilhões de meninos e meninas no planeta, da minha geração,
das gerações anteriores e até as gerações atuais, sem sobra de dúvida, tiveram
Stan Lee em suas vidas, como criador e formador de parte do seu imaginário pop
cultural.
Quem nunca leu um gibi com Thor, Hulk, Homem-Aranha, Panteras
Negras, Quarteto Fantástico, Capitão América, Homem de Ferro, Mulher Maravilha,
Dr. Destino entre muitos outros e se deliciava com histórias que nos levavam a
outros cantos do planeta, do mesmo jeito em viagens que nos levavam aos
confins do Universo?
Assim como eu, muitos garotos adquiriram o gosto pela leitura lendo gibis, mas eu sofria uma peculiaridade e não sei se houve paralelo entre
outros meninos da minha geração.
Pelo menos nunca ouvi falar.
Pelo menos nunca ouvi falar.
Eu estava proibido de ler gibis pela minha mãe.
Isso mesmo. A mulher que adorava ler e que me ensinou a ler quando
eu tinha apenas 4 anos de idade, proibiu-me simplesmente de ler gibis.
Inocentes revista de super-heróis e até mesmo as mais
inocentes ainda, revistas do Walt Disney e da Turma da Mônica.
Essa aparente contradição era nada mais, nada menos, motivada
pelo fato dela recentemente ter se tornado membro de uma igreja
pentecostal e que na época era muito rígida e proibia os fiéis de assistirem televisão, lerem essas revistas, de jogarem futebol, enfim, tudo que uma criança amava fazer.
Devo lembrar que estávamos no início, mas já era o auge da
ditadura militar.
E para meu tormento todos os meus amigos tinha os gibis da
Marvel. Eu pegava emprestado, sem dúvida, e corria para um corredor isolado do
outro lado da casa, me agachava e mergulhava num mundo de estórias coloridas e
vivas e que apagava da minha mente naquele momento, toda a percepção do mundo real
a minha volta.
De repente... um tapa na minha orelha, que mais parecia uma
pancada de marreta me jogava para longe do meu objeto de prazer, que naquele
momento era o Thor e seu martelo mágico.
E dali para o fim do corredor, era um festival de sopapos,
chineladas e chicotadas, acompanhados de lições raivosas contra o imenso pecado
que eu estava cometendo e como consequência a condenação horrível no inferno e o tormento eterno.
Mas o que me doía mais, era quando ela rasgava um gibi emprestado
e o jogava no lixo, me deixando na maior saia justa com meus amigos.
E foi assim durante alguns anos, até que a rigidez religiosa
foi em parte abandonando minha mãe, o que me trouxe alívio, porque realmente
amava ler gibis e livros, em especial as estórias da Marvel.
Ontem, Stan Lee partiu deste planeta, provavelmente levado
para um mundo fantástico. Quem sabe idêntico aos que povoavam suas estórias e habitado
por super seres.
Stan Lee partiu aos 95 anos, alheio as surras e castigos que
eu levava por causa dos seus gibis.
Mas com certeza, de uma coisa ele sabia.
Lee sabia que por meio de seus super-heróis, ele fazia parte
do universo das crianças da Terra, que cresceram com ele e muitas, assim como eu,
aprenderam a gostar de ler com suas estórias, outras aprenderam a desenhar e
outras simplesmente, mesmo depois de adultas, continuaram a curtir o Universo
Marvel que se modernizou e posteriormente foi para as telas de cinema e da
Internet.
Stan Lee partiu sabendo que bilhões de crianças cresceram
com ele, que também o viram crescer e nunca o esquecerão enquanto viverem.
Boa Viagem, Stan!
Boa Viagem, Stan!